O Dia do Consumidor foi criado para proteger e lembrar dos direitos daquele que adquire produtos e serviços, entretanto, não aborda, ao menos de forma explícita, requisitos relativos à governança ambiental, social e corporativa, mais conhecidos por ESG. 

No Brasil, os direitos do consumidor são expressos no Código de Defesa do Consumidor (CDC) – Lei nº 8.078, de 11.09.1970. O documento é considerado o principal instrumento de garantia de defesa da referida parte das relações de consumo.

O referido diploma legal aborda diversos pontos como garantias básicas, qualidade de produtos e serviços, prevenção e reparação de danos à saúde e à segurança, responsabilidades e práticas comerciais dentre outras.

Entretanto, o CDC não aborda, ao menos de forma explícita, requisitos relativos à governança ambiental, social e corporativa, mais conhecidos por ESG, sigla formada pelas letras iniciais dos mesmos verbetes empregados na língua inglesa, quais sejam, Environmental, Social and Governance.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), organização da sociedade civil cujo objetivo é gerar e disseminar conhecimento a respeito das melhores práticas relativas ao assunto, define a governança corporativa como sendo “o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas”.

Já segundo o Chartered Financial Analyst Institute (CFA Institute), associação global de profissionais de investimento, a governança ambiental envolve a gestão dos riscos ambientais e os consequentes impactos ao meio-ambiente, enquanto a governança social reflete a atuação da organização frente aos demais stakeholders (pessoas ou grupos com interesses em um empreendimento), tais como colaboradores e comunidades afetadas pela atuação da empresa.

Relevância do ESG no consumo

O crescimento da relevância do ESG no consumo é evidenciado como por meio de diversas publicações. Em uma das mais recentes, um relatório disponibilizado em fevereiro de 2023, as empresas McKinsey & Company e a Nielsen IQ, divulgaram, como resultado de pesquisa realizada em conjunto, que, nos Estados Unidos, produtos que alegam ter atributos relacionados a ESG tiveram um crescimento acumulado médio de 28% nos últimos cinco anos, em comparação aos 20% calculados para aqueles que não o fizeram.

O propósito da investigação era identificar o quanto efetivamente a questão de ESG interfere na decisão do consumidor. O trabalho investigativo, ainda que inconclusivo sob diversos aspetos, deixa evidente a propensão ao crescimento da demanda por tais produtos.

Diversas empresas brasileiras vêm investido em um posicionamento responsável no que tange aos aspetos socioambientais. No entanto, o ponto central do debate que permanece em torno da evolução do mercado de consumo que incorpora os atributos de ESG está na relação entre a demanda e a pré-disposição a pagar mais por esses produtos.

Se, por um lado, ainda segundo a mesma pesquisa, os consumidores afirmam estar mais conscientes e predispostos a desembolsar quantia superior por bens cujos atributos incorporem aspetos de ESG, há empresas que afirmam que não são capazes de gerar demanda suficiente para tais bens.

A valorização e o aumento da demanda por produtos com apelo ESG e, portanto, considerados mais sustentáveis por parte dos consumidores, passarão, inevitavelmente, pelo equilíbrio entre aspectos culturais de valorização de ESG e a adequação de preços finais ao consumidor.

Índices de sustentabilidade

Recorrendo-se ao mercado de capitais como referência de adoção e práticas de ESG   observa-se que os gestores que buscam a realização de investimentos em empresas de ilibada reputação no que tange ao cuidado com o meio-ambiente, com a sociedade e aos aspectos gerenciais, o fazem, essencialmente, por buscarem essas evidências como parte da sua estratégia de mitigação de riscos e identificação de oportunidades.

Não à toa, empresas de capital aberto esforçam-se para serem incluídas em índices de sustentabilidade, tal como o ISE B3,  de forma a serem reconhecidas, em bolsas no Brasil e no exterior, como “amigas do meio ambiente” e preocupadas com a sociedade e boas práticas de gestão.

Considerando-se as ponderações acima mencionadas, questiona-se:  se uma das principais contribuições do Código de Defesa do Consumidor é o reconhecimento da vulnerabilidade do adquirente de produtos ou serviços perante o mercado, no Dia do Consumidor, não faz sentido indagar-se quais critérios de ESG e de que forma poderiam ser explícitamente introduzidos no Código de forma a direcionar o mercado a práticas mais responsáveis?

Práticas mais responsáveis

Há que se levar em conta que há quem defenda que o texto do CDC já incorpora elementos de sustentabilidade, ainda que não de forma inequívoca, e que, consequentemente, não necessita de intervenções. Essa diferença de opiniões é, por si só, justificativa suficiente para se aprofundar a análise de seu conteúdo.

O Dia do Consumidor é de indubitável importância frente às conquistas obtidas até o momento, as quais, por óbvio, merecem ser celebradas.

No entanto, considerando o crescimento de sua expectativa por práticas mais responsáveis do ponto de vista socioambiental, cabe ao varejista manter postura visionária e antecipatória sobre as mudanças do mercado, de forma a satisfazer os anseios de seu cliente no futuro e, por conseguinte, proteger a viabilidade de seu negócio.

Texto escrito Por David Douek

David Douek é Diretor Vogal do IBEVAR, mestre e doutorando em administração pela FEA USP, arquiteto e urbanista pela FAU USP e administrador de empresas pelo Mackenzie. Fundou e dirige a OTEC, empresa de consultoria que atua no setor de real estate. Possui especializações em Green Buildings (Colorado State University), Investimentos Imobiliários (FGV), e Operações de Mercado Financeiro (FIA). Atua, também, como conselheiro do capítulo brasileiro da IBPSA.

Fonte: Redação IBEVAR