Fazendo uma analogia à mitologia grega, como um Édipo moderno, as empresas têm a difícil missão de sobreviver aos impostos para não serem devoradas.

Na mitologia grega é famosa a figura da esfinge, parte mulher, parte leão, com asas de rapina que assolou a cidade de Tebas e que antes de devorar suas vítimas fazia um jogo, apresentando um enigma, caso a vítima conseguisse resolver, teria sua passagem liberada, senão, faria parte do cardápio.

Diante nesse exposto, teríamos uma infinidade de temas ao falarmos sobre impostos, desta maneira, tentarei agrupar os problemas de ordem tributária com foco nas empresas e os desafios que elas devem enfrentar. Destacarei 5 grupos: 1) Quantidade; 2) Forma de cálculo; 3) Cumulatividade; 4) Regime tributário; e 5) Situações especiais.

Quantidade

Ao falar sobre quantidade de impostos, não me refiro apenas ao percentual da carga tributária sobre o PIB (algo em torno de 40%), também não vou discutir a qualidade da devolução dos impostos via serviços públicos.

Quando penso nessa relação, vem à mente o termo Belíndia, que o economista Edmar Bacha cunhou para o Brasil em 1974. Belíndia era a combinação da tributação de país de primeiro mundo (Bélgica) com serviços públicos de país de terceiro mundo (Índia).

É possível pensar em outras combinações de países (em 2014 a revista britânica “The Economist” utilizou Italordânia: Itália + Jordânia), porém, a lógica permanece a mesma. Quando falo sobre quantidade de impostos, quero destacar a maneira como os impostos incidem sobre as atividades da empresa, para ilustrar o que quero dizer, vamos avaliar um modelo de Demonstração de Resultados de Exercício (DRE) e perceber como a quantidade de impostos afeta a empresa.

De uma maneira simplificada a DRE indica o quanto a empresa ganhou ou perdeu em um determinado período a partir da seguinte conta:

Receita (venda ou prestação de serviços)

(-) Despesa (sacrifício para melhoria do resultado)

(=) Resultado (lucro ou prejuízo)

A partir desse raciocínio inicial, a DRE é estruturada agrupando os tipos de despesas e gerando subtotais para melhorar a qualidade da informação.  Abaixo segue o modelo de DRE e para este texto, vou procurar focar na questão dos impostos.

A receita operacional bruta representa tudo o que empresa vende ou presta serviço decorrente de sua atividade principal em um determinado período.

Ajustes na receita bruta

O primeiro grupo de despesas é chamado de “deduções”, ou seja, ajustes na receita bruta, são “despesas” que a empresa não realiza para melhorar o resultado, mas são situações que são impostas para a empresa. Os melhores exemplos das deduções são os impostos decorrentes da atividade como IPI, ICMS, ISS, PIS e COFINS. Se você ficou perdido na sopa de letrinhas segue abaixo um breve glossário:

IPI: imposto sobre produtos industrializados;

ICMS: imposto sobre circulação de mercadorias e serviços;

ISS: imposto sobre serviços;

PIS: programa de integração social;

COFINS: contribuição para financiamento da seguridade social.

Percebam que, de acordo com o ramo de atividade da empresa, ela pagará o imposto correspondente, ou seja, um comércio paga ICMS, um prestador de serviços paga ISS, e aqui deixo uma provocação para vocês, por que uma empresa ao desenvolver sua atividade paga PIS e COFINS ?

Questões sobre a mão de obra

Os próximos grupos de despesas são os custos e as despesas operacionais e nestes itens temos como um dos principais componentes, os funcionários.

Neste item podemos destacar o impacto dos encargos sociais sobre a folha de pagamento. Outra provocação: para cada funcionário que a empresa contrata ela paga mais um funcionário somente em função dos encargos sociais.

Este tipo de situação faz que a nossa mão de obra seja, ao mesmo tempo, mal remunerada (pela visão dos funcionários) e cara (pela ótica da empresa) e leva ao fenômeno conhecido como pejotização, mas isso é assunto para um próximo texto.

Resultado financeiro líquido

Depois disso, temos o resultado financeiro líquido da empresa, ou seja, o confronto entre as receitas financeiras e as despesas financeiras da empresa. Para simplificar vou trazer os exemplos mais comuns das duas situações: juros.

Quando a empresa faz uma aplicação financeira, ela recebe juros (receita), quando a empresa tem uma dívida, ela paga juros (despesa). Existe um imposto chamado IOF (imposto sobre operações financeiras), precisa falar mais algo mais?

Percebemos que a empresa paga impostos decorrentes de sua atividade, sobre os meios de produção, sobre o endividamento e se depois de tudo isso a empresa ganha alguma coisa, adivinhe qual será o prêmio?

Resposta correta: mais impostos, os famosos impostos sobre a renda. Não estou falando sobre alíquotas, porém, somente os impostos sobre a renda podem consumir 34% sobre o ganho das empresas.

Forma de cálculo

Em relação à forma de cálculo, cabe destacar 2 aspectos. O primeiro é que temos impostos em esferas diferentes: federal, estadual e municipal. Isso dificulta a apuração dos impostos, lembrando que a empresa não pode alegar ignorância sobre as regras de tributação o que leva desvio de finalidade para as empresas: ao invés de pensar em estratégias, melhorias de produtos e canais de distribuição, a empresa precisa investir em suas áreas contábil / fiscal / jurídica para apurar e pagar corretamente os impostos.

Exemplificando, vamos pensar no ICMS que é um imposto estadual sobre circulação de mercadorias e serviços. Quantos estados existem? Quantas mercadorias e serviços existem? Multiplique as duas respostas e terá uma ideia da complexidade do assunto, com mais um agravante, trata-se de um processo dinâmico com atualizações diárias sobre o tema. O IPI que é um imposto federal tem alíquotas que variam de 0 a 330%.

Para ilustrar um pouco mais a situação, um dos pontos mais discutidos de mais uma tentativa de “reforma tributária” não reduzia um único ponto percentual de alíquota de impostos, porém, buscava aglutinar o cálculo de alguns impostos e com isso facilitar o recolhimento.

As aspas na expressão reforma tributária reforça a dificuldade que teremos para efetivar uma verdadeira reforma tributária. Já que citei o ICMS como exemplo, esse imposto é a principal fonte de arrecadação dos estados, portanto, qualquer reforma que altere o ICMS, enfrentará forte resistência dos estados e a demanda por compensações e criações de fundos que acarretam em outros impostos.

A famosa lei Kandir é um exemplo dessa situação, de maneira sucinta a lei Kandir desonerou o ICMS nas exportações e depois de anos de discussão no judiciário o Governo Federal compensará a perda de arrecadação dos estados. Mais uma provocação: quem será que vai pagar essa conta?

Preço de venda

O segundo aspecto relacionado à forma de cálculo está relacionado ao preço de venda. Na hora de formar o preço de venda, as empresas embutem os impostos, desta forma, falamos que os impostos são calculados “por dentro”, entretanto, se estivermos falando de uma indústria, o IPI é acrescido sobre o preço de venda, ou seja, ele é calculado “por fora”. O que isso significa ? Que o IPI é calculado sobre outros impostos com efeito em cascata.

Na segunda parte do texto vamos discutir os outros problemas de ordem tributária, que leva a distorções na lógica dos negócios, se torna um convite para sonegação e fraudes, porém, decifrar o enigma da esfinge se torna questão de sobrevivência para as empresas.

Em tempo o enigma da esfinge era o seguinte: o que que tem quatro patas de manhã, duas à tarde e três à noite ? E a resposta que levou Édipo a se tornar rei: o ser humano, que engatinha na infância, caminha sobre duas pernas ao ser tornar adulto e precisa de um auxílio de uma bengala na velhice.

Texto escrito por Rogério Alexandre Gonçalves de Sousa (Administrador, contador e Professor e Coordenador de Cursos da FIA – LABFIN.PROVAR).