Em entrevista exclusiva ao Novo Varejo, parceiro de conteúdo do IBEVAR, Teresa Cristina Charotta, Diretora Executiva do Instituto, fala sobre o ‘senso de pé no chão’ que marcou a edição de 2024 da NRF. 

O que fazer diante de um cenário de crise? Olhada de maneira geral, a pergunta é complexa. Mas, quando trazida para o ambiente de negócios, a resposta dada pelos players do mercado é quase sempre a mesma: se agarrar ao básico e à tese central.

Olhar de especialista

Essa dinâmica deu o tom da edição 2024 da maior feira de varejo do mundo, a NRF Big Show, realizada na cidade de Nova Iorque entre os dias 14 e 16 de janeiro.

Para abordar este e outros pontos, a diretora executiva do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo (IBEVAR), Teresa Cristina Charotta refletiu sobre os principais pontos da feira em uma entrevista de profundidade exclusiva ao NovoVarejo.

Entrevista na íntegra

Novo Varejo: Qual a sua avaliação geral da participação dos brasileiros na NRF 2024? O período de instabilidade do varejo no Brasil influenciou, de alguma forma – positiva ou negativamente – o volume de varejistas brasileiros na feira?

Teresa Cristina Charotta: A participação de brasileiros na NRF 2024 foi maior de quase 10% em relação a 2023 que teve a participação de 2.283 versus 2495 de 2024). O recorde foi em 2019, com 3400 brasileiros que visitaram a NRF, antes da pandemia e com um cenário econômico diferente do atual. Acredito que o câmbio também influencia no poder de participação, visto que a inscrição ficou bem mais cara do que anos anteriores (varejistas US$ 1000 e outros participantes US$ 3400).

NV : Na sua visão, qual foi a narrativa central da NRF 2024?

TCC: A narrativa desse ano foi “Make it matter”, ou seja, Faça com que isso importe. O varejo está percebendo que não são somente tecnologias que farão acontecer. O varejo físico é relacional e esse é o grande desafio para o mercado americano.

NV: Se tivesse de apontar 5 a 7 dos insights principais da feira, quais você apontaria?

TCC: 1 – Economia digital é uma realidade – Segundo Lee Peterson 68% dos consumidores preferem compras on-line;

2 – Empatia digital – segundo Kate Ancketill PI (Personal Intelligence) é realizada a partir da fusão da AI generativa com os dados pessoais apoiando a vida do indivíduo. Experimentei e gostei…muito interessante (PERSONA AI);

3 – Customize seu produto será uma tendência cada vez maior e trazendo a reciclagem como um novo ecossistema de consumo circular, ou seja: O que eu faço importa, novo e usado é o novo, tudo junto e misturado…etc;

4 – Fidelidade adquirida será focada em vender facilidade e exclusividade de produtos e serviços;

5 – Logística de vizinhança, ou seja, quando mais rápido a entrega e como rastrear seu pedido será diferencial;

6 – O livecommerce levará o entretenimento, engajamento e orientação das marcas, será preciso interagir com a comunidade;

7 – A era da influência e da co-criação vai além do produto e exige de espaços de voz para influenciadores e a comunidade.

NV – O cenário global de tendência de queda de juros permeou, de alguma maneira, as discussões da feira em torno das expectativas sobre a disponibilidade de crédito e comportamento do consumidor ao longo do ano?

TCC – O cenário global não foi otimista, visto que temos duas guerras, inflação, deflação e menos crédito.

A era da abundância acabou e hoje vivemos uma 3ª guerra que é a climática e que já está impactando na vida das pessoas e de cidades. As duas maiores potências mundiais – China e EUA, emitem a maior quantidade de carbono do planeta e vem sofrendo sanções por não estarem cumprindo o acordo de Paris. Atualmente, crescem menos ou estão vivendo uma crise social sem precedentes que afeta o consumo. Hoje, precisamos fazer mais com menos e com sustentabilidade.

NV – A pauta ESG teve espaço significativo durante essa última edição da NRF? Se sim, como o papel do varejo nesta agenda foi discutido?

TCC – Foi comentado, mas não com profundidade. Sempre colocando a IA como a nova forma de aumentar a eficiência, produtividade, substituir tarefas chatas e que veio para ficar. Uma pena, porque para o varejo brasileiro seria uma oportunidade de ouvir como desenvolver o ESG. Ainda estamos longe dessa iniciativa. Muito se fala, mas pouco se faz com propriedade. As palestras de Lee Perterson e da Kate Ancketill foram as que trouxeram a importância do ESG como o futuro do consumo consciente e que levará a uma nova sociedade.

NV: Em algumas edições, a NRF tende a tratar a tecnologia a partir de uma ótica ‘futurista’, olhando para tendências que não necessariamente estão sendo aplicadas na atualidade, mas que podem vir a se tornarem realidade no futuro. E em 2024, como a temática da tecnologia e inovação foi tratada?

TCC: Concordo, sempre bem futurista e nem sempre aplicável na prática. Dessa vez, percebe-se uma preocupação de apresentar cases reais e como a IA pode ser aplicada das mais diversas formas, de uso pessoal até como uma forma mais complexa para as organizações.

NV: Você acredita que o varejo nacional poderá aplicar boa parte das ‘recomendações’ da NRF 2024 ou a realidade tratada lá ainda está distante da brasileira?

TCC: Escrevi um artigo sobre a importância do fator humano e que a próxima NRF deveria acontecer no Brasil. Por quê? Podemos ensinar como gerar demanda num período de crise econômica e ser mais relacionar com o shopper consumidor e gerar mais vendas recorrentes. Que os nossos colaboradores estão mais bem preparados para atender na loja física do que o mercado americano e muito mais. Precisamos dar valor menos ao quintal do vizinho e valorizar mais as conquistas brasileiras para elevar o nível de consciência.

Ficou claro para os varejistas e participantes brasileiros que a IA é meio e não fim. Precisamos usá-la para as mais diversas formas e que se transformará na nova revolução industrial.

NV: Gostaria de te perguntar sobre as visitas técnicas realizadas pelo IBEVAR. Quais cases mais te impressionou nessas ‘andanças’?

TCC: As visitas técnicas foram um caso à parte, como surpresas de posicionamento para atender um novo comportamento da sociedade, a exemplo da Abercrombie & Co. que mudou seu perfil de loja temática para um nova loja mais intimista e focada nas gerações que buscam menos exploração do corpo e mais sustentabilidade e comprometimento social da marca. A nova loja da Tiffany é deslumbrante. Após 4 anos de reforma, a LVMH nova dona da marca consegue unir o clássico com o que tem de mais contemporâneo aliado aos elementos digitais como o painel 3D que envidraça a entrada principal e traz esculturas e artistas plásticos para unir beleza e cultura.

Outro destaque é a loja da Petco que se reinventa com o que tem de mais moderno em customização, produtos, serviços e concierge para que o dono possa tratar ou cuidar do seu animal como um filho. Menos filhos e mais animais estão sendo projetados. A loja do Harry Porter é fantasia e mágica, no qual você pode esquecer o mundo complexo que a sociedade está vivendo. Numa das ruas de NY cruzei com um carro autônomo e que o fato de pisar na faixa de pedestre, ele diminuiu a velocidade até parar e eu atravessar.

Isso significa que teremos no futuro menos acidentes e que mudará o mercado automotivo, de seguros e serviços. As farmácias de cannabis viraram a sensação, uma das que visitei como a Gothan oferece entretenimento e uma diversidade de produtos que impressiona, tais como: balas, goma de mascar, protetor labial, skin care, shampoo, condicionador, produtos para unhas e uma infinidade de produtos, além da manipulação de medicamentos e tratamentos a base de cannabis.

Outra surpresa foi revisitar a loja da Apple que fica na 5ª avenida no qual traz para dentro da loja um acolhimento para você se sentar embaixo de árvores desidratadas. Me chamou a atenção o espaço de apresentações de produtos e serviços para que os interessados possam tomar a melhor decisão.

E para fechar outro destaque e sucesso é a loja da Wegmans Food Market que traz um diferencial com as sessões de comidas prontas. Inclusive, o mercado imobiliário pesquisa onde será aberta uma nova loja para poder explorar novos empreendimentos. A qualidade, o atendimento, a variedade de produtos e segmentações das culinárias proporciona ao consumidor uma experiência única e com custo benefício que agrega valor ao produto, promoção e serviço.

Fonte: Redação IBEVAR e NOVO VAREJO