Bancos e grandes varejistas na internet mobilizaram-se pela aprovação de proposta que pune fraudes digitais

O aumento das fraudes eletrônicas e golpes telefônicos durante a pandemia fez os bancos e grandes empresas de comércio na internet se mobilizarem pela aprovação de projeto de lei que cria novos tipos penais para punir essa modalidade de crime e endurece outros já existentes. O texto passou pelo Senado no fim do ano e teve requerimento de urgência aprovado pela Câmara dos Deputados na quarta-feira.

“Até 2012, invadir um dispositivo não era crime. Hoje é crime, mas vale uma cesta básica. E quem invade encontra tanta coisa valiosa que não tem valor inibitório”, afirmou o advogado e especialista em direito digital Renato Opice Blum.

As tentativas de golpes virtuais no ano passado causariam um prejuízo estimado em R$ 3,6 bilhões, segundo a ClearSale, que atua para grandes bancos e empresas de e-commerce. O número de fraude teve alta de 53,61% em comparação a 2019, ante um crescimento de 73,84% na quantidade de transações digitais.

Segundo Adriano Volpini, diretor da comissão executiva de prevenção a fraudes da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), as tentativas de “pishing bancários”, como e-mails falsos para obter dados, cresceram 80% durante a pandemia, os golpes de falsas centrais de atendimento, 70%, e as tentativas de golpes contra idosos, 60%. “Um crime sem consequência acaba gerando um estímulo muito grande”, disse.

A Lei 12.737, de 2012, incluiu no Código Penal a previsão de que invadir dispositivo informático alheio, como um computador ou celular, para obter, adulterar ou destruir dados é crime com pena de detenção de três meses a um ano. É o que se considera infração “de menor potencial ofensivo” e, para os especialistas, não é o suficiente para coibir esse tipo de conduta.

Pela lei atual, a pena seria cumprida em regime aberto e há ainda a possibilidade de conversão no pagamento de cestas-básicas, por exemplo. O projeto de lei do senador Izalci Lucas (PSDB-DF), já aprovado pelo Senado e na lista de prioridades da Câmara, eleva a pena para de um a quatro anos de reclusão (que, diferentemente da detenção, pode ser cumprida em regime fechado).

O texto cria novos tipos penais para enquadrar essas fraudes e amplia a punição para furtos cometidos por meio eletrônico (como tirar o dinheiro de uma conta bancária após fraudar o aplicativo do banco no celular). A pena mínima hoje desses furtos é de dois anos e passaria a quatro anos, com a criação de agravantes que poderiam até duplicar o período de prisão, no caso de uso de servidor fora do país para dificultar a identificação e se o golpe foi aplicado em idoso. A pena máxima é mantida em oito anos.
Outro ponto positivo, na opinião de Blum, é atrair a competência para investigação e julgamento desse tipo de crime para o local da vítima. “Espero que o PL 4554 seja aprovado tanto com aumento de pena para a invasão quanto com as duas novas figuras, estelionato digital e furto mediante fraude digital”, disse.

O deputado Vinicius Carvalho (Republicanos-SP), autor do requerimento de urgência e que deve assumir a relatoria da proposta na Câmara, disse que o aumento do comércio eletrônico durante a pandemia levou também ao crescimento no número de fraudes. “Sendo assim, se faz necessário adequar o ordenamento penal ao ‘novo’ tipo”, afirmou. O governo está a favor da proposta, mas sugeriu alterações no prazo mínimo da pena, de quatro anos para três anos, e nos tipos penais que serão criados.

Os partidos de oposição, como o PT, criticaram a proposta dizendo que mudanças no Código Penal devem ser discutidas com mais calma, mas o requerimento foi aprovado com 354 votos favoráveis e só 83 contrários, número suficiente para aprovar também o projeto. Apesar disso, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), autor de proposta semelhante, afirmou que tentará convencer os partidos de esquerda a endossarem a votação.

Volpini, da Febraban, defende que a integração do Brasil no comércio digital internacional exige como requerimento básico uma pena mais rigorosa. “O futuro das transações é de um comércio digital mais intenso. Países que já possuem essa relação digital mais madura têm leis e políticas muito mais duras para as pessoas que cometem crimes nos meios digitais”, disse.

Essa também é a posição do presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo e Mercado de Consumo (Ibevar), Claudio Felisoni, que acredita que o crescimento nas vendas pela internet continuará mesmo após a pandemia da covid-19. “Teremos uma nova forma de relacionamento e isso requer que as empresas e os consumidores se sintam seguros com o uso desse meio de compras”, afirmou.

Fonte: Valor Econômico