As empresas, por meio de seus departamentos de marketing, de supply chain, comercial e de expansão, estão constantemente buscando novas formas de usar os dados e obter insights. O que poderia soar estranho, mas já é realidade, é que o departamento de Recursos Humanos das empresas também está inserido nesse cenário.

De acordo com uma pesquisa da Towers Watson (empresa de consultoria em Recursos Humanos com 15 mil associados e presente em 37 países), as empresas estão dedicando parte de seus orçamentos de tecnologia para o RH. Tais recursos estão cada vez mais associados ao uso de Big Data Analytics para melhorar os processos de contratação, retenção de talentos, treinamentos e avaliação de desempenho.

É objetivo desse novo artigo trazer algumas práticas de Big Data Analytics executadas pela área de Recursos Humanos que podem servir de inspiração para os varejistas.

Contratação

Um dos maiores desafios da área de Recursos Humanos das empresas de varejo está relacionado à diminuição do tempo, dinheiro e esforço gastos para encontrar o candidato certo para a vaga em aberto. De acordo com o ebook 50 HR and Recruiting Stats That Make You Think, da Glassdoor, as empresas americanas recebem, em média, de 200 a 300 currículos para cada vaga em aberto. São necessários, aproximadamente, 52 dias e um montante de US$ 4 mil para finalizar cada processo.

Imagine a economia de tempo, recurso e dinheiro ao construir um algoritmo ou ferramenta que consiga identificar rapidamente, por meio da varredura em redes sociais, na base de dados interna e em sites de empregos, grupos de candidatos elegíveis para disputar a vaga. Isto já é realidade no Brasil. Uma empresa especializada em recrutamento para o varejo construiu, em conjunto com uma startup, uma plataforma que promete encontrar candidatos, contactá-los e, até mesmo, interagir com eles por meio de testes checando, portanto, sua aptidão para o cargo em menos de 24 horas.

Mas a ferramenta não faz o trabalho sem um input certo, sem a especificação do RH contratante. A chave para o sucesso da plataforma está muito mais relacionada com critérios utilizados para a busca do que propriamente com sua rapidez.

Muitas vezes, o que se define como característica essencial para uma determinada posição pode não ser tão relevante assim. É aí que entra uma nova etapa no uso de Big Data Analytics pela área de RH. Para entender os critérios fundamentais para preencher uma vaga, deve-se antes identificar tendências que realmente importam.

Imagine que, antes de lançar os critérios de busca, as empresas tenham analisado várias contratações anteriores ou desligamentos, os tenham correlacionado com desempenhos e, então, descoberto que:

  1.  as pessoas que tinham experiência relevante no emprego anterior não eram necessariamente mais suscetíveis a ficar na empresa no longo prazo.
  2. ou que o tempo de permanência do funcionário em organizações anteriores do mesmo ramo não afetava significativamente sua curva de aprendizagem inicial na nova organização.

Em outras palavras, as análises internas podem e devem desmistificar as crenças e apresentar novos critérios.

Mas não só as contratações externas são alternativas para o RH. Um exemplo bastante interessante do uso das informações para identificar potenciais candidatos internos para as vagas abertas pode ser dado pela rede Hyatt, que atualmente opera com 13 marcas divididas entre seus mais de 600 hotéis e resorts, estando presentes em 56 países.

A solução criada pela equipe de RH do Grupo, em conjunto com uma parceira tecnológica, identifica aspectos dos currículos dos funcionários, seus desempenhos e, diferentemente de outras empresas, considera também suas preferências. Estas preferências podem ser as mais diversas possíveis, tais como: disponibilidade para mobilidade, identificação com zonas de clima tropical, aptidão para uma determinada língua, entre tantas outras. Além disso, a plataforma acompanha estes mesmos funcionários em redes sociais permitindo identificar, com boa acuracidade, a veracidade das preferências apontadas.

A partir das características apontadas como essenciais para uma vaga aberta, inclusive preferências, a plataforma de gerenciamento de talentos da Hyatt consegue identificar rapidamente um grupo de potenciais candidatos. Segundo fontes do grupo, houve um aumento de 53% no movimento de funcionários entre hotéis e uma diminuição significativa do tempo gasto para recrutar. Houve também maior transparência nas oportunidades da rede, aliada à percepção dos funcionários de que a empresa realmente se preocupa com gestão de carreira, o que pode ser traduzido em aumento de retenção e da satisfação dos empregados.

Retenção

Retenção é outro grande desafio dos departamentos de RH das empresas varejistas. Normalmente as taxas de rotatividade são altas. Segundo o Ranking NOVAREJO Brasileiro 2016, esse percentual foi de 38,5% em 2015. Como ainda é visto como um setor de primeiro emprego, o varejo tem um alto percentual de perda de funcionários.

Mas as empresas varejistas podem fazer uso de Big Data Analytics para reduzir esses índices.

Devem correlacionar, por exemplo, dados de pesquisa de satisfação, absenteísmo, cumprimento de jornadas legais e entrevistas de saída e desempenho, a ponto de identificar padrões que culminam no desligamento voluntário dos funcionários. De posse das informações, o departamento de RH elaboraria uma política de retenção, agindo preventivamente ao perceber o padrão em um funcionário propenso a sair da empresa.

Como contraponto dessas análises, pode-se identificar padrões de funcionários mais propensos a atingir seus objetivos e motivos. Tais descobertas podem surpreender algumas organizações. De acordo com o Estudo de Recrutamento Yello de 2016, os chamados millennials (pessoas nascidas nas décadas de 1980 e 1990), em particular, valorizam o crescimento da carreira e as oportunidades de aprendizagem muito mais do que o dinheiro. Assim, ao identificar pontos como este, os empregadores podem ajustar suas estratégias de retenção para atender às expectativas dos funcionários. Segundo o inglês Simon Sinek, em entrevista à Revista Consumidor Moderno 227 (edição de agosto/2017), as companhias deveriam tirar vantagem de características únicas dos millennials. Se existir um projeto ou uma oportunidade que pressuponha grande incerteza, exija decisões rápidas ou até mesmo riscos, sugere-se convidar os millennials.

Outra forma de coletar dados dos funcionários para posterior utilização está relacionada aos sensores. Análises de sensores de movimentação dentro do Centro de Distribuição, por exemplo, podem dar sinais de alerta em tempo real e ajudar os departamentos de RH a administrar melhor aspectos de segurança do trabalhador. Análises de sensores de entrada e saída dos empregados permitem à própria empresa varejista encontrar novas maneiras de melhorar a conformidade com a regulamentação trabalhista, podendo evitar prejuízos e adequando vários pontos às políticas de governança.

Treinamento

Um terceiro grande desafio dos departamentos de RH das empresas varejistas refere-se ao treinamento. Algumas companhias têm avaliado frequentemente a eficácia das iniciativas de treinamento.

O Grupo Virgin, player nos setores de Viagens e Lazer, Telecomunicações e Mídia, Música e Entretenimento, Serviços Financeiros e Saúde e Bem-estar, com cerca de 69 mil funcionários espalhados por 35 países, criou um sistema central de gerenciamento de desempenho e aprendizagem.

Nesta plataforma os gerentes podem definir objetivos de carreira e metas de performance. Todos os funcionários podem visualizar seus treinamentos de curto e longo prazo, além de monitorar o status de seu desempenho. O conteúdo destes treinamentos é oferecido em uma variedade de formatos, incluindo sala de aula e e-learning, sendo entregue de forma sensível de acordo com as preferências do funcionário. É possível, por exemplo, personalizar o lay out e o tipo de linguagem: mais visual ou mais auditiva. Cada nível, ou mesmo posição, tem acesso a treinamentos específicos com conteúdo customizado.

Como resultado para a corporação, além do acompanhamento do funcionário, percebeu-se que esse sistema de aprendizagem unificado (principalmente o e-learning) reduziu o tempo de treinamento em 35%, dando às equipes mais tempo para se concentrar no trabalho do dia a dia. Permitiu também que as taxas de conclusão aumentassem, e que a conformidade chegasse a níveis superiores a 90%. Outro ganho percebido com o sistema automatizado diz respeito à redução do tempo de administração por parte do RH. Eliminou-se uma margem de erro gigante e o trabalho manual de atribuição e rastreamento de treinamento.

Os treinamentos podem ser ministrados não só para funcionários. Também podem ser oferecidos aos franqueados, inspirando-os a dar prioridade ao aprendizado e criando uma melhor experiência de parceria. Os franqueados, em conjunto com o RH, podem rapidamente perceber o valor do conteúdo e como o mesmo se correlaciona com o aumento dos índices de satisfação dos clientes e com o retorno financeiro.

Conclusão

Nem Big Data nem tecnologia assumirão o lugar de um profissional qualificado de RH. Ambos podem ajudá-lo, norteando suas decisões e aumentando sua produtividade. O acesso cada vez maior do RH às descobertas de Big Data Analytics reduz os cronogramas e os custos de recrutamento, prevê futuras necessidades de contratação, retém talentos e, em última instância, capacita o departamento, tornando-o um parceiro realmente estratégico.

Fonte: Hekima | Leonardo Pellegrino